Assim como no resto do mundo, em africa o casamento é um acontecimento que envolve a família e a união de duas pessoas do sexo oposto, com idade compreendida para casar. Neste mesmo continente existem várias tradições com relação ao casamento, diferenciando-se de nação a nação e de tribo a tribo, apesar de sempre existir algo em comum em muitos deles por pertencerem a mesma árvore genealógica.
“Quando um casal decide se casar, em algum momento antes da cerimónia de casamento é feito uma festa para celebrar o pagamento do dote”.
KULEMBA
Kulemba, termo de origem quimbundo, uma das línguas bantu do grupo Benue-Congo, de onde se origina a palavra alembamento (termo aportuguesado), que é uma cerimónia matrimonial (casamento) tradicionalmente protagonizada pela família do pretendente, no caso o homem com afeição a uma mulher.
Conforme tradição, antes mesmo de se chegar a essa etapa, recomenda-se certas cautelas pontuais ao conceber um relacionamento:
O primeiro passo é condição sine quo non para se concretizar o objetivado. É necessário que tenhamos forte atração pela pessoa pelo qual queremos conviver e compartilhar o resto de nossa vida. Assim fica mais fácil desenvolver com essa pessoa um amor profundo.
Após se confirmar o primeiro passo, o segundo seria então a identificação dos laços culturais do futuro cônjuge. É necessário que esta pessoa compartilhe culturalmente os mesmos hábitos, costumes, práticas religiosas, etc., connosco para que o futuro lar não seja um mar de contradições e de muitos problemas. Por exemplo, seria arriscado um homem de origem Bacongo casar com uma mulher da tribo Himba da Nação Herero, pois são realidades completamente diferentes. O recomendado sim, é ter alguém com mesma linhagem etnolinguística e tribal.
O terceiro passo dessa etapa é de responsabilidade familiar. Ou seja, depois do moço mostrar interesse e amor pela rapariga e a mesma corresponder (cumprindo o 1º e 2º passo), o mesmo deve comunicar este sentimento aos tios. Estes por sua vez terão a missão de avaliarem e fazerem o juízo da família congênere (seus antecedentes, seus problemas, coisas boas e más) e do comportamento da suposta futura filha. Estas avaliações são feitas não só pela família do moço, assim como também da rapariga.
Atenção: antes mesmo não pode haver relações sexuais.
“Makanha” a apresentação.
Em caso de se ultrapassar todas as espectativas e se chegar a um consenso familiar, os tios do moço devem dirigir-se aos tios da rapariga para “bater a porta”, declarando que seu filho gostou da sua filha e que pretende com ela formar uma família, e levando consigo um valor monetário simbólico e outras coisas como símbolo de sua união. Este ato é chamado de “Makanha” na língua quimbundo. Uma vez cumprida esta parte, os tios da rapariga informam a comunidade que ela já está ocupada e daí reforçar-se o controle sobre ela.
Dias depois, os tios da rapariga enviam uma carta de pedido que descrimina os artigos que devem ser entregues como dote. (os artigos que se pede, dependentemente da tradição variam de tribo a tribo). Em função disto, a família do moço prepara-se, adquire os artigos pedidos na carta e acertam a data de encontro com a contraparte.
Chegado o dia marcado para a entrega do dote, a família do pretendente é recebido gentil e dignamente com panos estendidos no chão (espécie de tapete) que os conduzirá até a porta da casa dos pais da rapariga. E é por este tapete de pano que deverão passar e ao mesmo tempo atirar dinheiro a cada pano constituinte deste, até que sejam levados em um compartimento onde se fazem presente os familiares da pretendida para testemunharem a entrega e recebimento do artigos. Antes da entrega, os representantes do pretendente (um tio e uma tia), apresentam primeiramente os parentes que os acompanharam e explicam os motivos que os levou lá. De seguida são entregues os artigos da carta, que são conferidos e confirmados pela família da pretendida. Em caso de conformidade, a família da rapariga agradecerá o gesto com aplausos e em caso de não conformidade, poderá haver alguns desentendimentos, mas porém, solucionáveis.
Entretanto, seguem-se a conversações entre as famílias. Mas acontece que nessa altura a rapariga não fica presente na cerimónia, ela é guardada em outro lugar, até que o tio do moço a revindique. Neste momento a família da rapariga arruma um trote (brincadeira), onde manda chamar a pretendida, que na verdade não é, para confundir o moço. a mesma é acobertada da cabeça aos pés com um pano e poderá ter a mesma característica física com a pretendida. Pedem ao moço para descobertá-la se achar que se trata da sua mulher, se falhar na escolha, é aplicada uma multa (valor monetário). Podem fazer isso uma ou mais vezes até o moço acertar.
Nas conversações são pormenorizados os hábitos e costumes da rapariga para no caso de ocorrer algumas desinteligência, o marido ter forma de repreender a mulher. E posteriormente a família do pretendente dá a conhecer à pretendida o que ela não sabe sobre o futuro esposo".
Atenção: Nestas cerimónias, tanto o rapaz como a rapariga não são permitidos opinar.
Logo, finalmente, a alegria acompanhada de lágrimas instala-se e faz-se a refeição (almoço ou jantar) de confraternização e felicitação ao noivado da filha. Em comunidades mais tradicionais esta festa poderá durar dias! Já em comunidades moderno-alienadas são só horas.
Criadas todas as condições de regresso, a noiva é levada junto com a família do esposo, sendo acompanhada por sua tia. E durante a caminhada esta tia vai exigindo a cada entroncamento, rios, riachos ou lagos (em caso de zonas rurais) algum dinheiro até chegar a casa do noivo onde as pessoas também estão em festa e satisfeitas com a entrada de mais um membro na família.
Nesta mesma noite, os noivos ainda não devem dormir juntos. A esposa dorme na sua nova casa com algumas crianças e jovens e sua tia; "o noivo dorme sozinho e ao amanhecer deve dirigir-se a casa onde esposa passou a noite, mas ainda não deve saudá-la". Antes entrega um dinheiro e acena batendo palmas (no mínimo 3 vezes) e as acompanhantes da noiva seguem-na e respondem a saudação. Só assim é que o noivo saúda a noiva.
No seguimento da festa, a noiva deve cozinhar para toda família para se comprovar se realmente sabe cozinhar. E no dia seguinte dever lavar a roupa de todo membro direto da família, e ela terá o privilégio de o fazer.
Durante a lua-de-mel (período de celebração privada que sucedo ao casamento), o casal receberá visitas que devem ser agraciados com algumas bebidas tradicionais e deles receberão os presentes. Terminada a festa de casamento, os noivos recebem conselho dos mais velhos e outros familiares experientes de como ter um lar bem-sucedido.
Nos seus primeiros anos de vivência, os mesmos não devem ficar só. Tem que ter duas meninas para ajudar nas tarefas de casa até que pelo menos nasce o primeiro filho. Aos primeiros filhos cabe ao pai atribuir os nomes, a mulher também atribui, mas com a permissão do seu marido.
Este casamento foi detalhado no contexto tradicional do grupo etnolinguístico Ambundo. Nele muitos rituais semelham-se também ao do grupo Ovimbundo.
Historicultura 2018